Privatização da Eletrobras: nenhum país do mundo com matriz parecida com a nossa vendeu o sistema

A conta de luz vai aumentar e a matriz energética vai ser mais suja. O Comitê bateu um papo com Fabíola Antezana (STIU-DF) para aprofundar o debate sobre a venda da Eletrobras

Ao todo, são 233 usinas de geração de energia (incluindo Furnas – que opera 12 hidrelétricas e duas termelétricas e a Companhia Hidrelétrica do São Francisco – Chesf). Outras seis distribuidoras, todas na região Norte e Nordeste. Mais de 61 mil quilômetros de linhas de transmissão, metade do total do país e o suficiente para dar uma volta e meia no planeta.

Os números mostram a dimensão da Eletrobras, a maior empresa da América do Sul em termos de energia. Desde junho do ano passado, o governo de Jair Bolsonaro tenta privatizá-la.

O processo está no Tribunal de Contas da União (TCU) que, agora, vai analisar o modelo de venda. Antes, o TCU liberou a venda por 6 votos a 1. Ao divergir dos colegas, o ministro Vital do Rêgo foi categórico: a Eletrobrás não deveria ser vendida. Mais: ele trouxe dados que mostram que o valor da venda está subestimado em R$ 63 bilhões. Na avaliação de Vital do Rêgo, o valor correto seria de R$ 130 bilhões. O governo aceita vender por R$ 67 bilhões.

Agora, o processo voltará ao TCU para que o tribunal aprove ou não o modelo de venda.

Diante de todo esse cenário, o Comitê em Defesa das Empresas Públicas bateu um papo com a diretora do Sindicato dos Urbanitários no Distrito Federal (STIU), Fabiola Antezana.

Comitê – O que representa para a sociedade a privatização da Eletrobras?

Fabiola – A sociedade irá arcar com os custos de um processo mal elaborado. Os impactos se darão em diversas áreas, desde o aumento da conta de luz a uma matriz menos limpa no futuro, na contramão do que vem ocorrendo no mundo. Desde os conflitos pelo uso da água nos locais em que já existe esse uso múltiplo compartilhado até a piora no serviço prestado, que é uma questão que ocorre nas privatizações de setores estruturantes. Veja que as experiências que temos no mundo, de países com matriz parecida com a matriz brasileira, não temos nenhum outro país que entregue suas águas nas mãos do capital privado. Ainda, há um viés que pouco se explora. Mesmo dentro daqueles que defendem as privatizações, há diversas vozes dissonantes por conta do modelo adotado e dos impactos que isso trará para toda a sociedade brasileira: incerteza quanto à modicidade tarifária que afetas nossas casas e toda a cadeia industrial brasileira.

Comitê – A conta de luz vai subir? Por quê?

Fabiola – Sim, a conta de luz vai subir. Os poucos estudos que temos, e diga-se de passagem, nenhum estudo atualizado por parte do governo federal, demonstram aumento na tarifa. Estudo da Aneel de 2017 analisando apenas o processo da descotização aponta aumento de algo em torno de 16%. Estudo da FIESP (federação das indústrias do estado de SP) impacto de R$ 460bi em 30 anos, a FIESP considerou além do processo de descotização dos 22 empreendimentos da Eletrobras, a entrada de 8milMWh de energia proveniente das térmicas inflexíveis a gás. O que é a descotização? Hoje, temos 22 empreendimentos que vendem energia pela operação e manutenção dos empreendimentos, estes têm a característica de já terem sido amortizados (pagos pela população) e por isso, vendem a energia a menor preço. A proposta do governo é fazer com que esta energia seja vendida a preço de mercado novamente, como se os empreendimentos fossem novos. É como dizer que ao comprar um carro ou uma casa, e depois de conseguir pagar todo o financiamento, ainda nos fosse dito que o carro/casa não pode ser nosso, e que precisamos pagar mais pelo que já é nosso.

Comitê – O ministro do TCU, Vital do Rêgo, fez um longo voto contrário a privatização. Ele afirmou, inclusive, que o preço da venda estava subestimado em mais de R$ 60 bilhões. Na sua opinião, porque o governo quer vender a Eletrobras por um preço abaixo do correto?

Fabiola – Para atender aos interesses do mercado financeiro que querem comprar a Eletrobras por um preço vil e conseguir serem donos da maior empresa de energia elétrica da América Latina. A autorização foi dada, mas não foi colocado prazo, ocorre que quanto menos informações mais fáceis de não despertar a consciência da população de que é um mal negócio.

Comitê – Ainda de acordo com o voto do Ministro Vital do Rêgo, países com matrizes energéticas parecidas com as nossas, nem cogitam privatizá-la. O governo está entregando um bem estratégico do país para o mercado privado?

Fabiola – Com certeza sim. A matriz brasileira tem uma característica que é o uso da água para geração de energia. Água esta que é vital a uma série de outras atividades. A Eletrobras detém 50% dos reservatórios deste país, o que significa dizer que estamos privatizando a bateria do setor elétrico. Nenhum país sério do mundo faz isso. Ademais, pelo tamanho da Eletrobras e sua relevância, a Eletrobras é um agente estratégico no setor, que poderá ditar os preços da energia no País.

Comitê – Como os cidadãos podem ajudar nessa luta?

Fabiola – Neste momento é essencial se informar e saber que a privatização da Eletrobras trará um impacto tarifário ainda não conhecido. As pessoas podem se informar no canal Salve A Energia. Entrar nas redes sociais, enviar e-mails, fazer ligações às instâncias decisórias. Perguntar ao TCU, ao Ministério de Minas e Energia, à ANEEL, à presidência da república, à CVM que enviem, que expliquem os impactos da privatização. A autorização foi dada, mas não foi colocado que o processo deve ser feito com tamanha pressa, sem estudos adequados, apenas para conseguir entregar a Eletrobras aos amigos de plantão.

Fonte: http://www.comiteempresaspublicas.com.br/

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