Desde que ocorreu a privatização da Eletrobras (junho/2022), a direção da empresa anunciou o planejamento promover uma série de mudanças na estrutura corporativa da empresa. Ainda em setembro de 2022 se anunciou o que seria uma espécie de “escritório de transformação” liderado pela vice presidenta de riscos e conformidade Camila Araújo, com a identificação de um conjunto de alavancas do setor divididas em quatro pilares que culminariam no que resolveram chamar internamente de reestruturação dos processos ou uma espécie de “virada de chave” da empresa estatal para uma estrutura privada.
Na prática, a tal reestruturação ou virada de chave deveria trazer uma nova configuração de processo serviços e setores com o objetivo de identificar e eliminar redundâncias entre processos e pessoas na Eletrobras Holding e nas subsidiárias Eletronorte, CGTEletrosul, Furnas e Chesf.
Mas a realidade foi bem mais dura com as ambições da direção da Eletrobras. Para compartilhar pessoas e processos entre as empresas, seria necessária a anuência do órgão regulador do setor elétrico brasileiro: a Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL). Os detalhes da anuência prévia constam na Resolução REN ANEEL 948/2021.
O problema é que a empresa de consultoria empresarial BCG (Boston Consulting Group) , contratada pela Eletrobras para ajudar a modelar a reestruturação e que já fez contratos que ultrapassam os R$ 100 milhões com a empresa, o Escritório de Transformação (Camila Araújo) e a Vice Presidência de Regulação (Rodrigo Limp) que interage com a Eletrobras, enfim todos os três atores envolvidos diretamente na execução da nova estrutura não identificaram que precisariam submeter à ANEEL a anuência para de fato de fato executarem a reestruturação.
Nessa bagunça que virou a Eletrobras privada, os responsáveis só perceberam que presariam da anuência prévia da ANEEL faltando 10 dias para começar a implantar a nova estrutura. Quando as vice-presidências identificaram a trapalhada, suspenderam todos os cronogramas. Foi um verdadeiro “barata voa”. O conselho de administração ficou furioso com a falha, uma vez que a reestruturação seria uma das prerrogativas para implantar a cultura de enxugamento da 3G de Lemann na Eletrobras.
Pedro Batista, Ivan Monteiro e Vicente Falconi pediram uma verdadeira devassa no processo para apurar responsabilidades e dar política de consequências. O processo gerou uma verdadeira guerra entre Camila Araújo e Rodrigo Limp. Wilson Pinto, então presidente da Eletrobras, também se desgastou muito tentando mediar este conflito. Wilson inclusive era um dos maiores entusiastas da virada de chave e internamente o que se diz é que esta confusão foi um dos principais pontos de catalisação da sua fritura e saída.
Na guerra entre Camila e Limp, por instinto de sobrevivência resolveram vender o sofá: sobrou para a consultoria BCG que teve o contrato suspensa. Depois de eleger a culpada, trouxeram outra consultoria milionária para finalizar o processo, a Kearney. E finalmente, depois de diversos anúncio de atraso de cronograma, deram entrada com o pedido de anuência para virada de chave na ANEEL, no mês de julho (processo ANEEL 48500.004074/2023).
O problema é que o texto enviado foi muito incipiente, incompleto para um tema tão importante. O que se diz é que a ANEEL identificou que para um processo de reestruturação tão complexo, de áreas de engenharia e operação de geração, transmissão e transformação de energia da maior empresa do setor na América Latina, seria necessário trazer aprofundamento, maiores detalhes dos ambientes de testes e uma implantação que pudesse mitigar os riscos identificados pela própria Eletrobras em seus comunicados: riscos de descontinuidade nas operações da empresa. Isso é sério. Seríssimo!
Agora, a direção da Eletrobras que foi incompetente em todo o processo de estudos, avaliação, pedido de anuência e implantação de testes da nova estrutura, se vê asfixiada pelo cronograma apertado que ela mesma se impôs. Ocorre que para efetivar a virada de chave em 2023, por exigências estruturantes da SOX (Sarbanes-Oxley, a empresa precisa de anuência até o fim desta semana para tão logo executar a nova estrutura antes de domingo (01/10) início de um novo trimestre. Tudo na correria, no improviso e na bacia das almas. O suprassumo da Eletro Irresponsabilidade a verdadeira marca desta direção sem rumo.
Para cumprir o prazo exíguo, o VP Rodrigo Limp apela para o lobby e a tentativa de pressão direta na Superintendência de Fiscalização Econômica, Financeira e de Mercado (SFF) da ANEEL que cuida da anuência da virada de chave. O que é um grande absurdo! Mais um sintoma de total irresponsabilidade com o coração da empresa e o Brasil. Em todas as empresas do grupo pipocam denúncias de implantação de nova estrutura e começo de compartilhamento de pessoas mesmo sem a anuência da ANEEL. Nós do CNE manteremos vigilantes e não vamos aliviar nenhum tipo de tentativa de pedalada ou de pressão na ANEEL. Já fizemos as devidas denúncias aos órgãos de fiscalização. Tem luta!
Reprodução do boletim do CNE.