Está marcada para a próxima quarta-feira, dia 20/04, a apreciação da última etapa do processo de privatização da Eletrobras no Tribunal de Contas da União. O governo tem pressa, sabe que lhe resta muito pouco tempo para entregar aos apoiadores do mercado financeiro a maior e mais importante empresa de energia elétrica do Brasil e da América Latina. Sabendo que há uma janela de oportunidade aberta até 13 de maio o governo por interlocução de Paulo Guedes parte para cima dos Ministros pressionando por um aval do TCU.
Caso vingue o plano de Bolsonaro, Guedes e companhia será, como eles mesmo dizem, a maior privatização da história do Brasil. Será também o maior saque ao patrimônio público da história brasileira, além de um duro golpe para os mais de 88 milhões de consumidores do país que terão que arcar com contas de luz cada vez mais caras. Aliás, até hoje o governo e a ANEEL se recusam a mostrar estudos sólidos demonstrando qual será o impacto da privatização da Eletrobras e da descotização de suas hidrelétricas nas tarifas dos consumidores. E fogem desse debate porque sabem o quanto o aumento da conta de luz é impopular
Só o aumento da conta de luz das famílias brasileiras já inviabilizaria todo o processo de privatização da Eletrobras. Vamos tratar disso cuidadosamente. Mas há também, uma coleção de atentados ao erário público, à soberania nacional e aos princípios básicos que regem a administração pública que listaremos a seguir.
- Subavaliação bilionária: Como bem demonstrou o Ministro Vital do Rego do TCU, a venda da Eletrobras, conforme proposto pelo governo, representará um desfalque de pelo menos que R$ 63 bilhões aos consumidores e aos cofres públicos. Essa quantia fica ainda mais escandalosa quando se considera que o valor proposto pelo governo para a venda da empresa é de R$ 67 bilhões, ou seja, um desfalque de quase 50% no valor a ser pago pela empresa;
Desse montante, R$ 46 bilhões se referem à uma manobra contábil do governo que retirou do cálculo do Valor Adicionado à Concessão a ser pago pelos novos donos da Eletrobras privatizada a componente relativa à venda de lastro de capacidade pelas Usinas da empresa;
- Desconsideração do valor do controle da empresa: Por mais escandaloso que seja um desfalque de R$ 63 bilhões não é o único e nem o maior. A União está renunciando ao controle de mais de R$ 50 bilhões em ativos de transmissão, mais de R$ 29 bilhões em participações, além de toda sua infraestrutura de telecomunicações, com mais de 16 mil km de fibras óticas sem receber nenhum real por isso.
Em qualquer lugar do mundo o controle de uma empresa tem grande valor. Menos para o governo (?) Bolsonaro.
Além disso, é importante lembrar que o valor de R$ 67 bilhões não é um preço mínimo, não haverá um leilão, não haverá ágio, esse será exatamente o valor arrecadado, ou seja, não haverá a possibilidade de o “mercado” encontrar o preço justo.
- Tarifaço: Até hoje o governo não apresentou um estudo sobre o impacto tarifário da descotização e da privatização. É mais do que óbvio que ao se passar o preço da venda de uma parcela significativa da energia do país de 110 R$/MWh para o preço de mercado, que no ano passado foi de 313 R$/MWh haverá aumento nas tarifas dos consumidores do mercado regulado, ou seja, os pequenos consumidores.
A FIESP e apropria ANEEL em 2017 já apontaram que esse modelo absurdo de privatização com descotização elevaria as tarifas dos consumidores e até 15%, mas o Ministério de Minas e Energia insiste em negar esse fato, não com estudos técnicos auditáveis, mas com “meras alegações”, como já apontou o próprio TCU.
- Inconstitucionalidade quanto ao setor nuclear: A Constituição Federal em seu artigo 20, inciso XXIII é clara em determinar que a energia nuclear é monopólio da União. Porém, sem que tenha havido nenhuma discussão no Congresso Nacional, nenhum debate com a academia, as Forças Armadas e nem mesmo com os órgãos especializados do setor, como a CNEN, através de uma mera resolução do Secretaria Especial Programa de Parcerias de Investimentos do Ministério da Economia, o governo Bolsonaro busca promover a maior reestruturação da história do programa nuclear brasileiro.
A modelagem da segregação da Eletronuclear, que não está detalhada na Lei 14.182/21, prevê que a Eletrobras privatizada mantenha nada menos que 70% do capital da Eletronuclear e, apesar de perder a maioria das ações ordinárias, a Eletrobras privatizada terá a prerrogativa de indicar nada menos que o diretor financeiro da Eletronuclear. Será a única empresa estatal do Brasil em que o presidente da república estará impedido de indicar um diretor.
Além disso, a proposta do governo prevê a criação de um Comitê, com participação paritária do governo e da Eletrobras privatizada, que terá acesso e poder de decisão sobre a construção da Usina Nuclear de Angra III, afrontando a Lei das Estatais e a própria Constituição Federal, além é claro, da soberania nacional.
- Risco ao Programa Nucelar Brasileiro: Até hoje foi a Eletrobras quem garantiu a sustentabilidade econômica para todo o Programa Nuclear Brasileiro. Sendo a Eletronuclear uma empresa historicamente deficitária é a Eletrobras pública quem garante a sustentação financeira para a Eletronuclear e de toda a cadeia nuclear do país, da mineração à produção do combustível nuclear.
Como não tinha o recurso necessário para indenizar a Eletrobras pela perda do ativo Eletronuclear, o governo optou por uma esdrúxula reorganização societária que mantém a Eletrobras privada, sabe-se lá controlada por quem, como sócia estratégica, com 70% do capital da Eletronuclear.
Só para concluir Angra III serão necessários mais R$ 21 bilhões, dos quais R$ 14 bilhões terão que ser aportados pela Eletrobras privatizada. Quem garante que a Eletrobras, cujos novos donos nem são conhecidos, não vá simplesmente abandonar a sociedade na Eletronuclear? Poderá a ENBPar, empresa recém-criada e sem nenhuma sustentabilidade financeira garantir os recursos para a conclusão de Angra III? Aliás, na hipótese de a Eletrobras privatizada abandonar a sociedade na Eletronuclear, como ficará a sustentabilidade e a própria segurança das nossas usinas nucleares? Até onde sabemos não há nenhum estudo avaliando os riscos dessa reestruturação atabalhoada no Programa Nuclear Brasileiro.
- Pedalada contábil: Visando facilitar a privatização para o mercado o governo busca de todas as formas rebaixar o valor da Eletrobras. Nesse sentido o próprio Ministério Público junto ao TCU apontou uma série de irregularidades, como o truque de considerar que a Eletrobras após a privatização existirá somente até 2052, uma canhestra manobra visando reduzir o valor das ações da empresa.
Outra irregularidade apontada pelo procurador diz respeito ao contingenciamento de mais de R$ 10 bilhões para o pagamento do empréstimo compulsório. Esse enorme contingenciamento, sem que tenha havido nenhuma justificativa jurídica para tal reduz o valor das ações da empresa, desvalorizando-a e o fato de ter sido feito às vésperas da privatização apenas reforça a convicção de que o governo busca de todas as formas facilitar a vida sócios no mercado, interessados em abocanhar a Eletrobras.
- Risco de governança internacional: Além do Programa Nuclear Brasileiro, a privatização pretende segregar a participação brasileira de Itaipu Binacional. O destino seria uma nova estatal, a ENBPAR. Mas quem é a ENBPAR? Uma estatal que só existe no papel, que tem 8 diretores e que sequer tem quadro funcional estabelecido ou autorizado pelo próprio governo.
Ninguém pensou nisso? Quem vai cuidar da comercialização da energia de Itaipu? Da conclusão da obra de Angra 3? Quem vai garantir a continuidade dos programas setoriais Luz pra Todos, Procel,..?
O governo expõe os Ministros do TCU publicamente, mas o Tribunal é independente e deve fazer valer sua prerrogativa constitucional de tratar este tema não no cronograma acelerado de um efêmero governo entreguista, mas no tempo correto, responsável e diligente da fiscalização e controle!
A privatização da Eletrobras é absolutamente lesiva aos interesses do país e da população. Não à toa pesquisa recentemente divulgada pela Poder Data (Poder 360) constatou que nada menos que 56% do nosso povo é contra a privatização da Eletrobras e apenas 29% a favor.
Mesmo com toda a narrativa fake privatista, os brasileiros e brasileiras sabem, por experiência própria que com a piora na qualidade e aumento nos preços que sempre acompanham as privatizações no setor de energia no Brasil, que a privatização da Eletrobras só trará serviços piores, desabastecimento e aumento na já caríssima conta de luz que nossas famílias têm que pagar todo mês.
A nossa luta já dura quase 5 anos e não agora neste momento decisivo que vamos esmorecer diante de um governo combalido aos farrapos. Sabemos do entreguismo de Paulo Guedes e seu covil de jagunços do mercado, mas vamos bravamente obstaculizar este absurdo! Vamos expor estes vendilhões da pátria à vergonha nacional! Falta pouco! Sigamos na luta! Firmes e obstinados até a vitória!