Mais uma vez a Eletrobras privatizada apresentou prejuízo. Dessa vez, no 4º trimestre de 2022, foi milionário: R$479 milhões! Com este, já é o 2º trimestre seguido em que a empresa apresenta prejuízo e, não por acaso, o 2º trimestre após a privatização.
O segundo resultado negativo da empresa pós-privatização é apenas um dos muitos elementos que corroboram para a visão de que esta foi uma privatização desastrosa para o país e não apenas para seus acionistas, que assistem o valor das ações cair vertiginosamente. Se já estava claro que a privatização foi um péssimo negócio para a população, em função do aumento do preço da energia elétrica e do abalo na segurança do abastecimento que ela provocará, agora fica claro que mesmo para os investidores abutres a privatização está sendo um mau negócio.
O lucro de R$3,6 bilhões apresentado no ano de 2022 se deve, integralmente, ao período em que a Eletrobras era ainda uma empresa pública.
Muito além dos prejuízos, a gestão temerária comandada pela diretoria bolsonarista e por um Conselho de Administração nomeado pela 3G Radar, está promovendo um verdadeiro desmonte da empresa. No fim de 2022, a Eletrobras promoveu a demissão de aproximadamente 2.500 trabalhadores por meio de um programa de demissão nem um pouco voluntário.
A empresa tenta criar uma narrativa positiva com o anúncio da contratação de 800 novos trabalhadores. Para a gestão 3G Radar, são apenas números. Para a população, uma manobra temerária, onde estão substituindo trabalhadores com muitos anos de experiência, conhecimento técnico acumulado e know-how, por outros que representam menos custos, para assim engordar os dividendos e os bônus dos administradores.
E há um planejamento para a demissão de mais 1.600 trabalhadores a partir de maio de 2023. Com isso, a empresa que em 2020 tinha cerca de 10.500 trabalhadores passará, em poucos meses, a ter apenas sete mil. Ou seja, a gestão irresponsável da Eletrobras quer demitir 4.100 trabalhadores em tempo recorde, colocando em risco a manutenção das nossas usinas e linhas de transmissão, tendo uma proporção de trabalhadores por MW em usinas e KM de linhas de transmissão sem igual no mundo. Não pode dar certo!
A irresponsável gestão da Eletrobras está promovendo também um crescente endividamento da empresa. Na sanha pela realização da privatização a qualquer custo, a Eletrobras precisou incorporar, via uma operação realizada por Furnas, a Usina de Santo Antônio, onde detinha participação minoritária. A operação trouxe um prejuízo milionário à empresa e aconteceu desrespeitando critérios mínimos de governança, financeiros, de transparência e de responsabilidade, e, por isso, foi denunciada pelas entidades sindicais e representativas dos trabalhadores.
Para levar adiante esse verdadeiro crime, a empresa precisou pagar caro aos bancos detentores de títulos de dívida, que viram seu risco aumentar junto com a elevação da dívida. Ao menos R$13,6 milhões foram pagos para que os bancos fizessem vista grossa para essa manobra. Com a incorporação da Usina de Santo Antônio, a Eletrobras viu sua dívida bruta saltar de R$35 bilhões para R$59 bilhões e sua dívida líquida (divida bruta menos caixa) aumentar de R$21,8 bilhões para R$34,7 bilhões.
Como agravante, na ânsia para alcançar resultados em curtíssimo prazo, a Eletrobras está elevando seu endividamento em dólar, deixando a empresa mais exposta às variações do câmbio. Como empresa de energia elétrica, praticamente toda a receita da Eletrobras é obtida em reais. Historicamente, a estratégia da Eletrobras sempre foi se endividar em dólar apenas para contrapor ao risco de câmbio provocado pelos recebíveis de Itaipu, reduzindo, assim, sua exposição à variação cambial. O endividamento em moeda estrangeira servia, assim, como hedge para sua exposição à valorização do real, promovendo uma exposição líquida praticamente nula. Agora, na gestão 3G Radar, mesmo após praticamente liquidada a dívida de Itaipu com a Eletrobras, a empresa continua a se endividar em moeda estrangeira e já acumula uma exposição cambial de mais de R$1,3 bilhão.
Para completar o quadro de total espoliação da empresa, a Eletrobras reduziu drasticamente seus investimentos ao longo dos últimos anos. A diretoria da Eletrobras está preocupada apenas em pagar elevados dividendos e impulsionar o valor de suas ações nas bolsas de valores para agradar aos grandes bancos e fundos de investimento, nacionais e estrangeiros. Não há mais nenhuma preocupação ou compromisso com o desenvolvimento do país. Nenhuma preocupação com a segurança do abastecimento de energia elétrica. Assim como ocorreu no início da década de 2000 na Califórnia, saem os experientes engenheiros e entram os “garotos tatuados do mercado financeiro” enquanto o nível de investimento da Eletrobras em 2022 passa a ser apenas 1/3 da média do investimento da empresa no início da década de 2010.
E essa redução drástica do investimento é, junto com o período de chuvas hidrologicamente desfavorável, uma das explicações para recente crise do setor elétrico do início da década de 2020. Ainda que tenhamos vivido um racionamento via preços, é possível afirmar que uma crise mais grave do setor elétrico só não se concretizou por conta das baixíssimas taxas de crescimento econômico apresentadas nos últimos anos. A demanda por energia elétrica tem apresentado um crescimento lento, praticamente nulo, e por isso exige-se pouco da oferta. A Eletrobras sempre atuou como a empresa que garantiu o crescimento da oferta, pois quem conhece a história do nosso país tem claro que o setor privado sozinho não garante a expansão necessária da oferta de energia elétrica. Mas, desde 2017, a Eletrobras abriu mão dessa sua função, deixando o setor elétrico à deriva e à espreita de uma nova crise, que surgirá assim que o país voltar a crescer.
Enquanto isso, o caixa da empresa, que antes era direcionado a construção de novas usinas, agora é utilizado para comprar empresas já constituídas, elevando o poder monopólico da empresa e permitindo a ela maior grau de manipulação dos preços da energia elétrica. Ao mesmo tempo, o caixa passa a ser direcionado também para recompra de ações, para o pagamento de dividendos cada vez maiores aos bancos e fundos de investimento e para os astronômicos salários do presidente, dos diretores e do conselho de administração.
E assim segue o projeto de destruição daquela que foi a maior empresa de energia elétrica da América Latina, com uma redução contínua dos investimentos que coloca o país cada vez mais em risco de desabastecimento e que provoca o progressivo aumento dos preços da energia elétrica. Junte a isso seu endividamento crescente, o aumento da exposição à variação cambial e a irresponsável perda de uma farta reserva de conhecimento técnico acumulado ao longo de muitos anos, que atingem diretamente a qualidade dos serviços prestados ao consumidor, e temos armada uma bomba relógio!
Em suma, a realidade da privatização mostra que em breve suas consequências maléficas em termos de qualidade dos serviços e preços ficarão cada vez mais óbvias para a população.
Por isso, é cada vez mais urgente a luta pela reestatização da Eletrobras e reiteramos nosso compromisso com a essa luta, para que a Eletrobras volte a ser uma empresa do povo e para o povo!