Na semana passada, mais uma vez, a Eletrobras passou em branco no Leilão de Transmissão. Entrou para participar, não para ganhar. O maior lote leiloado no certame de transmissão foi arrematado pela empresa Estatal Chinesa State Grid. À Eletrobras coube apenas fazer um jogo de cena, para se justificar para o Ministério de Minas e Energia, que havia cobrado da direção da empresa maior empenho nos leilões. O Ministro Alexandre Silveira pediu e a Eletrobras ignorou.
O compromisso com os acionistas e fundos abutres é mais forte que o compromisso com o Estado brasileiro. Afinal, a justificativa para a privatização, conforme consta na medida provisória, era “obter novos recursos para que a Eletrobras possa continuar contribuindo para a expansão sustentável do setor elétrico, em novos empreendimentos de geração e de transmissão de energia elétrica”.
Novos recursos entraram com a privatização, mas o destino planejado pelos novos controladores para esses recursos e para todo o patrimônio acumulado na empresa durante os anos de prestação de serviços públicos de qualidade será outro. Os grandes fundos financeiros que controlam a Eletrobras não estão preocupados em garantir novos investimentos para o país. Querem apenas se apropriar dos recursos da companhia e de seu patrimônio, e estão fazendo isso pagando salários e bônus milionários aos diretores e conselheiros e priorizando a utilização do caixa para o pagamento de dividendos e a especulação no mercado de ações. Não por acaso, o principal investimento da Eletrobras em 2023 não foi em nenhuma usina ou linha de transmissão, mas na recompra de ações, que custou quase R$2 bilhões aos cofres da empresa. Como revelado por um dos conselheiros da Eletrobras em áudio divulgado pela imprensa, para eles “a Eletrobras não é uma empresa de energia, é um banco”.
A Eletrobras, que historicamente sempre atuou para garantir a modicidade tarifaria, a expansão do sistema elétrico e, principalmente, para assegurar o controle de ativos estratégicos e da tecnologia nacional no setor de transmissão, hoje apenas assiste de longe o avanço das empresas estrangeiras sobre as principais linhas do sistema.
Antes do golpe parlamentar sofrido pela presidenta Dilma, o grupo Eletrobras tinha atuação marcante nos leilões de transmissão, gerando grandes deságios nos certames. Entre 2011 e 2012, por exemplo, as empresas do grupo Eletrobras arremataram 22 dos 43 lotes de transmissão leiloados. Mas hoje a Eletrobras entra nos leilões para não ganhar, pois assim sobra mais caixa para os fundos abutres que controlam a companhia.
Desde que o governo Temer iniciou o processo de privatização da Eletrobras, mais de 76 lotes de transmissão (42%) nos leilões não tiveram ofertantes, atrasando a expansão e colocando em risco o acesso à energia para milhões de brasileiros. Essa situação só mudou depois que a ANEEL elevou a taxa de remuneração regulatória dos ativos de transmissão. Ou seja, teve que ceder a pressão dos agentes privados, jogando o aumento da conta para o consumidor, para variar. Isso mostra também que o relativo “sucesso” anunciado pelo MME é Aneel dos recentes leilões de transmissão anunciado é uma farsa, é a outra face do aumento dos custos para o consumidor.
A população continua refém da ganancia dos agentes privados, pois, com a Eletrobras entregue aos abutres, não temos mais uma empresa pública de grande porte com potencial para entrar nos leilões garantindo a expansão, tendo como contrapartida apenas uma remuneração justa. Para que isso volte a ocorrer, basta o governo cumprir sua promessa de campanha e pegar de volta o que lhe é de direito, o controle da Eletrobras. A cada dia que passa com a Eletrobras sob controle dos abutres, maior é a conta a ser paga pela população, maior é o controle estrangeiro sobre o setor elétrico, menor é o domínio das empresas nacionais sobre os ativos estratégicos e sobre a tecnologia, e maiores são os riscos a soberania nacional. Reestatização já!
Reprodução boletim do Coletivo Nacional dos Eletricitários.